Por Tea Frigerio
Nem todo ir é andar de discípulo, de
discípula.
A mulher ia todo dia ao poço. Um ir
obrigado. Um ir cotidiano. Um ir trabalho. Era sua tarefa cotidiana: dura,
escaldante, pesada, monótona.
Aquele dia, como todo dia foi com seu
cântaro atingir água ao poço. De longe avistou um homem, um viajante. Receosa
se aproximou: ignorar, estar alerta para o que der e vier. O desconhecido podia
se tornar um perigo, uma ameaça?
O passo firme, o coração vacilando e ao
chegar ao poço um pedido a surpreendeu: “dá-me
de beber” (Jo 4,7). O homem era
judeu e bem atrevido lhe dirigia a palavra em publico e pedia água. A água da
hospitalidade a uma mulher samaritana!
Hospitalidade é sagrada. Ao viajante não se
pode negar água, mas pode-se questionar: “como
tu pede água a uma mulher, a uma samaritana?” (Jo 4,9).
No pedido, na interrogação inicia-se a
conversa. Conversa que começa a partir do trabalho, passa pela vida pessoal,
entra na religião. Conversa que ora corre paralela, ora é desencontro, até se
tornar encontro, parceria.
Água, água viva, dom, derramar do Espírito,
memória bíblica, espiritual a fala de Jesus.
Ao falar de água a mulher tem um objetivo claro: tornar menos pesado e
entediado seu trabalho. Quem sabe o judeu tenha um segredo para não vir mais
até a nascente e e mesmo assim ter abundância de água. Falas que correm
paralelas sem se encontrar.
E teu marido
pergunta Jesus? É vida pessoal! Ao falar de sua vida pessoal a samaritana
fecha a conversa: no íntimo da pessoa pode entrar somente quem tem entrada
franca. O homem, o judeu, o inimigo atávico do seu povo, considerada raça
mestiça e heterodoxa, não tem permissão de entrar. Desencontro, embora as
palavras acordem uma memória antiga a da origem do seu povo.
Então a mulher dá uma virada, ela toma a
palavra, puxa a conversa e o assunto é religião. Religião era justamente um dos
motivos da inimizade: ”Onde adorar no
Garizim ou em Jerusalém?” “Nem no Garizim nem em Jerusalém, em espírito e
verdade” (Jo 4,19-21.23).
A mulher entende, pois sua experiência fala
de corpo habitado na gestação. E, se o corpo da mulher pode ser habitado, o
corpo humano pode ser habitação de Deus.
Judeu, homem, profeta, enviado, palavras de
encontro, palavras de diálogo, palavras de revelação. “És quem esperamos? Sou Eu que falo contigo” (Jo 4,25-26). À
pergunta uma resposta, revelação: Sou eu.
O andar se torna correr. O cântaro é
esquecido. Não é água que oferece! Oferece um anuncio, um testemunho: “Venham ver encontrei, ele me disse tudo o
que fiz!” (Jo 4,39).
Na sua voz ecoam as palavras de Jesus: “Mestre
onde moras? Venha ver!” (Jo 1,39).
Na corrente do discipulado, um novo anel.
No anuncio a parceria. Mulher, Samaritana, discípula, evangelizadora.
Ver, andar, conversar, pedir, questionar,
dialogar, abrir-se ao Outro, à Outra, o nascer da parceria do anuncio, da
parceria do Reino.
Poço:
memória matriarcal
Poço:
trabalho duro
Poço: encontro desafiante
Poço:
revelação surpreendente
Poço:
anuncio novidade
Poço:
testemunho parceria
Poço:
memória da mulher Samaritana.
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