Texto de Tea Frigério
Maria de Mágadala e Maria, mãe de Tiago, Salomé de
madrugada ao nascer do sol foram...
Assim a comunidade faz memória, memória que chega
até nós. Não conseguiram esperar o raiar do dia, precisaram ir. Ao ir vão
carregadas de perguntas: a pedra pesada quem a rolará... quem é o jovem...
ressuscitou não está aqui... ide... vos precede na Galiléia... saíram, fugiram
do tumulo... tremor e estupor...
Seus corpos estão habitados por interrogações,
perguntas. A narração as guarda no tempo e o mistério chega até nós.
As mesmas interrogações e perguntas, o estupor e o
mistério chegam até nós, nos engravidam e a pergunta nos habita: A Ressurreição
aconteceu?
É pergunta que habita muitas pessoas: A Ressurreição
aconteceu? Como aconteceu?
A Ressurreição aconteceu!
A Ressurreição devia acontecer!
Foi gestada a longo tempo, desde que Jesus saiu de
Nazaré e começou a travar relações. Relações que fascinaram e apontaram a
superação de dogmas, regras, preconceitos raciais e étnicas. Relações de uma
mesa inclusiva onde podiam sentar mulheres e homens, pessoas com estigmas,
diferentes fugindo das regras sociais e patriarcais. Relações que fascinaram e
fizeram sair de casa, tornaram corajosas e pessoas saíram revelando-se, ousaram
caminhos inusitados.
Relações gestando o novo...
O aroma do perfume anunciou sua chegada. Maria
entrou na casa, os cabelos soltos, e o perfume entrou com ela. Aproximou-se de
Jesus, rompeu o vaso, derramou o balsamo nos pés de Jesus, os friccionou com
seus cabelos. Deixai-a fez por mim, antecipou.
Jesus aprendeu e na ceia lavou os pés, vós também...
Vos reconhecerão...
Relações gestando o novo...
Maria de Mágdala, Maria, Marta, Susana, Joana,
Salomé e as mulheres que o haviam seguido desde a Galiléia, servindo ao Reino,
subiram com Jesus até Jerusalém. Subiram até o Calvário e à sombra
amedrontadora da cruz elas ensaiam o ministério da circularidade, com a
presença de João o rosto feminino do discipulado.
Relações gestando o novo...
As mulheres que vieram da Galiléia ficaram
observando...
E veio José de Arimatéia homem bom e justo, esperava
o Reino, pediu o corpo... E a circularidade se refaz na solidariedade, nos
gestos que cuidam do corpo amado... Descer da cruz, acolher nos braços,
massagear com aromas e perfumes lavando as feridas, limpando a sujeira,
devolvendo a dignidade ao corpo violentado, assassinado. Tocar, acarinhar o
corpo amado, envolvê-lo em lençóis, depô-lo no sepulcro, na terra, ventre da
terra.
Relações gestando o novo...
O ventre da terra acolhe o corpo de Jesus de Nazaré,
o corpo do homem cujas relações tinham um “que” nunca visto!
Maria de Mágdala liberta dos sete demônios
patriarcais. Marta amada por Jesus, primeira a acreditar que ele era a Vida.
Maria a mulher do perfume, aroma que é profecia.
Lázaro, João, José de Arimatéia vislumbraram com ele
um jeito novo de viver a masculinidade.
As mulheres desabrochando em nova feminilidade.
Jeitos novos de ser homem, de ser mulher, humanidade
nova, novo jeito de tecer relações.
Este homem não podia morrer e ficar na morte,
anulado por uma pedra que torna o ventre da terra tumulo?
O que seria da Vida que haviam vislumbrado?
O que seria da utopia de céu novo e terra nova?
O que seria?!
O ventre da terra se abriu para acolher o corpo do
homem que por amor à vida proclamou “Eu dou a minha vida, ninguém a tira. Dou-a
e retomo-a”. Amor fiel, amor radical. Amor que assume dar sua vida para
denunciar os sistemas civis e religiosos que se mantém no poder eliminando a
vida, deturpando a vida, matando a vida.
Uma pedra sela o ventre da terra, útero que acolhe o
corpo do homem que havia ousado ensaiar novas relações. Relações inclusivas.
Relações circulares. Relações que colocam em circulo os bens, o poder, os
afetos, os corpos. Relações inclusivas ao redor da mesa que rompe os
preconceitos, os paradigmas, os dogmas, as falsidades da uma sociedade e
religião patriarcal.
O ventre da terra se faz útero, a gravidez que havia
começado em encontros amorosos sobre a terra tem que dar à luz.
As mulheres sentam observando, esperando, amando.
As mulheres voltam para casa preparar aromas e
perfumes.
As mulheres inquietas de madrugada, vencendo o medo,
vão... Vão pedir ao ventre da terra que devolva o corpo amado, o corpo de Jesus
de Nazaré, o devolvam Ressuscitado.
Vocês pensam que estou devaneando, que enlouqueci.
Sim louca de amor como Maria de Mágdala. Louca de amor em busca do Amado.
Louca de amor como as mulheres que de tão
surpreendidas são tomadas de estupor e o estupor as faz tremer. Tremer de medo
ou pequena flâmula de esperança.
Louca de amor com elas e que não permitem que a
morte vença, a Vida é vitoriosa.
Ressuscitou! Sim fizeram acontecer a
Ressurreição!
Ressuscitou! Estas mulheres e homens fizeram rolar a
pedra, gritaram: Jesus de Nazaré vem para fora. Ele ouviu o grito e veio para
fora: O Ressuscitado!
A terra pariu, deu à luz: O Ressuscitado!
Elas e Eles foram anunciar: Está vivo nas relações
recriadas.
Ressurreição em nossa vida reflete na parábola da
borboleta. O casulo é útero, nos fala de escuridão, silencio, dor, morte,
espera...
Casulo pede a espera do tempo propicio.
Casulo nos convida a contemplar o lento sair da
borboleta, seu abrir de asas, o ensaio e enfim a leveza de seu voo que embeleza
a criação.
Borboleta é contemplar a Ressurreição acontecendo no
universo, na humanidade, em nossa vida. É contemplar nosso crer, nossa própria
vida fazendo acontecer a Ressurreição.
Mistério!
Mistério pede contemplação!
Mistério desvela a Ressurreição!
Mistério convida a fazer acontecer a Ressurreição!
Mistério – Ressurreição: Mulher e Homem relações
recriadas!